Compreendendo a essência da base do objeto de estudo teórico: O povo

O texto analisado foi “Colônia, culto, cultura”, em Dialética da Colonização, de Alfredo Bosi. É um texto muito importante que trata dos aspectos estruturais da formação do povo brasileiro. Suas influências recebidas, bases, técnicas, conceitos. Analisando nossa formação a partir da análise de nosso colonizador, ligado a um contexto histórico. O contexto histórico, sua observação é fundamental para esse entendimento e compreensão. Afinal, são esses fatos globais ou particulares os responsáveis pelas ações e reações que influenciarão e alterarão a linha do tempo no processo de formação histórica.

E porque esse texto é tão importante? Porque essa análise da formação de nosso povo é tão crucial?
Para estudarmos um povo, seus aspectos individuais, sua localização histórica, é necessário que conheçamos a essência desse povo. Ter conhecimento do que, de quem somos. É muito difícil, se não impossível, analisar fatores particulares e gerais de um povo, sem conhecer sua estrutura, formação, base constituinte.

Quando se estuda comunicação social, entre outras áreas, principalmente relacionadas às humanas, nos envolvemos diretamente com características ligadas ao povo. Teoria da comunicação, que estuda interferência e influência psicológica midiática na população, sociologia, filosofia, psicologia. Porém, para estudarmos e aplicarmos esses conceitos, é necessário um conhecimento geral da base de todas essas áreas, teorias: o próprio povo.
Bosi nos auxilia muito nesse entendimento e compreensão, explicando a partir de uma forma firme, decidida. Apresentando sua teoria, firmada em fatos, exemplos, inclusive incluindo seus estudos de caso. Os estudos de caso são muito bem empregados, para firmar sua base teórica.
Esse texto é primordial e serve de introdução para todos os diversos estudos e análises envolvendo o povo brasileiro. Além do povo brasileiro, ele nos apresenta aspectos e conceitos gerais para a compreensão global das populações. As ferramentas para que possamos compreender a formação dos povos em caráter global. Para isso, precisamos analisar e saber certas especificidades, peculiaridades e individualidades desses povos.
____________________________________________________________________
Entender colonização é entender problemas conflitantes da matriz e seu processo de expandir-se. Texto de Bosi é chave para compreendermos a formação, genética de nossa cultura através de elementos literários, tenta mostrar “o que somos”. A compreensão do que é cultura, cultura brasileira, sentido de nação e de povo. Colo, cultus, cultura é a etimologia da palavra. Cultura é o conjunto de sentido, o que é, o que age, o que procede uma determinada sociedade. Sobre colônia, é importante entender a formação da sociedade brasileira. Culto, sentido ético, moral das leis estabelecidas por nós. Identidades que formam o povo brasileiro (indígenas, portugueses, africanos).
Entender porque ocupamos este espaço territorial é tão importante do que saber quem o ocupou. Não existe povo que não tenha reivindicado um espaço de terra, mesmo os nômades. O povo deve lutar por uma pátria.Unidade de nação formada por espaço geográfico, base territorial, a(s) língua(s). Deve haver uma unidade linguística. Ocupar o espaço e dialogar são conjuntos. A história, religião são aspectos culturais importantes.
A organização econômica (moeda), determina como funcionam as relações de troca. São as três dicas para definir uma unidade nacional, formação de pátria (base territorial, língua e moeda). É importante e necessária a definição de colônia, culto e cultura.
Os três primeiros capítulos do livro abordam o sentido de colônia. Muitos historiadores que tentam entender nossa formação devem primeiro entender como foi Portugal, e depois como foi o Brasil.
Sobre Portugal, da província de Portucális, houve uma disputa entre mouros (considerados como forças do mal) e os cristãos. Os Mouros invadiram a Europa, trazendo engenharia moderna, naval, arquitetura moderna, tecnologia. A idéia eurocêntrica de que o mundo, o desenvolvimento, começa na Europa é falsa. É uma visão própria do processo de colonização do qual fazemos parte. Não existe apenas uma história, uma visão.
Idéia de colonização é dizer que estão levando cultura, humanismo, desenvolvimento para o mundo onde conceitos de desenvolvimento, liberdade, economia, democracia, modernidade não estão organizados. Nenhum país dominante diz que está lá para explorar, dominar. Utilizam o discurso positivo, dizendo que são um povo superior que ajudará o outro a desenvolver-se.
A formação da identidade cultural de um povo dá por processos simbólicos (canto, rito, dança). Esses símbolos são derivados da religião. É importante analisar que, no caso do Brasil, para o domínio do catolicismo, houve tentativa de extinguir a religião nativa.
Antigamente, tudo que era feito, seja no estilo de colonização ibérica, era tudo dado em nome de Deus (matar indígenas, dizimá-los por doença). Isso acaba gerando um conflito entre bandeirantes empreendedores, contra os jesuítas que querem humanizar. Isso é uma dialética, uma luta de contrários. Se você confronta idéias distintas, terá algo mais sólido. Nesse caso, foi um conflito de catequizar, humanizar as almas e o conflito em explora-las (jesuítas x bandeirantes). Neste período muito complicado, a situação era muito ruim para os negros também. Com Igreja Católica desconsiderando que os negros tivessem uma alma, chegamos a encontrar expressões, como “Liberdade para os índios e misericórdia para os negros”.
No início, a palavra cultura estava ligada a cultivar estratos materiais, construir sociedades auto sustentais, criar elementos que giram essas sociedades. Essa matriz dá sentido a três concepções que explicam a formação da sociedade moderna.
A partir do século XVIII o cultivo, extrair o que sustenta a sociedade, pode ser entendido como o que alimenta a alma. Cultura como algo que se planta, pastoreia passa a não ser vista somente como algo material, mas às idéias da humanidade. Usam cultura também para explicar fenômenos socais escolhidos. Antigamente a cultura tinha o sentido de cultivo, alimento; quando transforma a idéia de alimentar seres humanos com alimentos, para alimentar sua alma, com pensamentos, muda-se o significado de cultura. Idéias passaram a ter algo concreto. Crítica à filosofia, que deve transportar-se em algo que pode ser concretizado. Filosofia precisa apoiar-se em pensamentos mais concretos.
O Brasil possuiu problemas do trabalho na fase colonial, do trabalho escravo e assalariado. É a utilização da expressão “O açúcar expulsou o índio”, que pode ser utilizado também nas relações gado / posseiro, soja / sitiante, cana / morador.
Somos um Brasil criado pelo latifúndio. Em alguns locares até existiu uma reforma agrária. No Brasil, isso não ocorreu. Somos constituídos por pessoas que possuem muitas terras. A possibilidade do escravo não era se transformar em trabalhador assalariado, mas refugiar-se em quilombos.
Bosi, em seu livro, trata a formação do povo brasileiro, destacando Gilberto Freire e Sérgio Buarque de Holanda, pensadores brasileiros que buscam informações, estudos para executar a pesquisa e compreender como o povo brasileiro foi formado. Tratam de elementos psicológicos, sobre a sociedade brasileira imposta a condições sociais.
Sérgio Buarque, em seu livro Raízes do Brasil, que é um texto inédito, clássico e original, aborda a formação do povo brasileiro. Disseca a estrutura política brasileira a partir do legado da colônia portuguesa para definir, entender como são as misturas de público e privado. A idéia de que tudo que é público torna-se privado no raciocínio das elites dominantes. Houve uma mistura entre público e privado, e quem administra faz isso de acordo com seus interesses privados. Isso é um legado colonial, eu posso gerenciar uma entidade pública de acordo com meus interesses privados, porque nunca teve uma regra, uma cultura contra isso.
O homem brasileiro é cordial, alegre, receptivo, mas o problema é cordialidade na incapacidade de gerar uma revolução, atrito para derrubar antigos sistemas. É preciso entender a formação de nossa cultura. A resposta para a sociedade ter aceitado tão bem a escravidão, foi a facilidade de ter mão de obra a baixo custo (solução econômica). E, considerando os negros como não possuidores de alma, como não sendo gente, eles foram o alvo para serem essa mão de obra escrava. Por sua vez, esses negros adaptaram-se a essa situação até mesmo com certa facilidade, devido ao fato de as condições sociais no Brasil não serem tão diferentes de onde eles viviam originalmente.
Bosi diz sobre a distinção de Antonio Gramsci (discurso orgânico, novas burguesias, opõem se no tradicional). Há mudanças de pensamento, influências burguesas nas elites brasileiras, expresso na formação de nossa cultura. Escritores, como Machado de Assis coloca discurso filosófico diferente do período colonial. Outros introduzem pensamento liberal, burguês no Brasil, pela necessidade do fim da escravidão e desenvolvimento do capitalismo. Mudar a monarquia pela república.
É um discurso orgânico contra o tradicional. Que é mais um exemplo de dialética. O velho contra o novo. Velhas e novas concepções convivem por um tempo até ter a substituição do velho pelo novo. É um processo onde existem conflitos, confrontos. Não é algo imediato, onde hoje penso de uma forma, e amanhã de outra. Para evolução do pensamento é necessário contrastes, diferenças. Transições, processos transitórios foram demorados no Brasil.
A transição de Brasil colônia para Brasil Império e por fim Brasil República foi demorado. É mais uma dialética, entre processo de exploração pleno (metrópole/colônia) contra o processo “cristão”, liberal.
Bosi faz uma análise e conclusão de que no Brasil a religião é meio barroca, meio mercantil. A que ostenta o ouro é a mesma que prega a simplicidade. Cobra-se a execução das obras para que se tenha o máximo dividendo possível. Em Minas Gerais, Aleijadinho faz os santos com rostos de pessoas comuns, fisionomia rústica de um brasileiro. Essa é a mesma Minas dos inconfidentes que procuraram uma ruptura drástica ao Império.
Houve também uma dualidade manifestada nas artes, expressões literárias entre pensamento conservador, colonial, monárquico, em oposição ao pensamento novo, pré-capitalista, que precede a independência do Brasil, a República.
Em Vox Populi vs. Epus Colonial (um parêntese camoniano), é definida a grandeza de Portugal. Origem portuguesa de grandeza no Brasil, marcada nos versos de Camões.
Em Portugal, existe o mito do Sebastianismo, utilizado como resposta à ele ter ficado preso, não conseguido superar-se (rei Dom Sebastião, responsável pelas conquistas financeiras, bonança, riqueza de Portugal, desaparece em confronto contra os mouros, e até hoje portugueses aguardam seu retorno). Portugal, vivendo nesta nostalgia, com vontade de ser grande, impõe seus elementos nas suas colônias, como o Brasil.

Em Sob o Limiar da Escrita, é dito que o povo que assistiu a partida de Vasco da Gama seria posteriormente o povo que viria a colonizar o Brasil. É retomada a idéia de que não há a possibilidade, condições de se afirmar que temos uma cultura pura, genuinamente indígena ou africana. A mistura das culturas é algo próprio para a formação dos brasileiros.
A oralidade, expressão através do culto são características da cultura popular.Tudo o que se pode considerar como possível de mudanças, alterações, você necessariamente dialogará com estruturas anteriores conservadoras de cultura. Bolamos instrumentos de diálogo, falamos mais rápido com outros, mas mantemos tradições culturais (exemplo: católicos, protestantes possuem as influências européias). Existe sempre uma influência anterior. Neste conjunto de religião, culto, multiplicidade de expressões, manifestações artísticas, formamos o Brasil.
Bosi faz um estudo de caso em seu texto, denominado “Uma litania cabocla na grande São Paulo. Ele participou de uma festa popular, em 1975, em Carapicuíba, festa religiosa, com churrasco. Antes do churrasco tinha uma missa. A família era brigada com o padre da religião, por considera-lo muito moderno. Chamaram então um capelão de fora para celebrar. A missa é realizada em latim. A composição majoritária das pessoas da festa era de gente descalça, sem dinheiro, pobres, simples. Porém, essas pessoas rezavam a missa em latim. Bosi espantou-se ao ver um povo que mal dominava nossa própria língua, respondendo em latim. E como essas pessoas falavam latim? Acontece que eles entendiam o que falavam, aquelas palavras e respostas para o ato simbólico da manifestação de fé. Eles não sabiam latim, mas sabiam o que aquelas determinadas respostas significavam. O motivo disso é a tradição. Antigamente, até meados do século XIX só se rezava em latim, no Brasil colônia. Até hoje esse tipo de missa existem. Aquelas pessoas que rezavam em Latim, eram em suma maioria analfabetas, mas dominavam pela oralidade aquelas manifestações eruditas. É a mistura do erudito e popular.
No texto, é tratado também sobre o sentido das formas na arte popular.
Por exemplo, trata da arte ligada ao pré-modernismo, fase romântica onde o “eu”, manifestação da arte na primeira pessoa tem influência da ideologia liberal. A transição colonial para república.
Já o barroco, em seu culto, tem influências católicas, que a monarquia acompanha. Romantismo, realismo, sai da ideologia barroca para a romântica. Sai das manifestações artísticas de fé, cultuar alguém, teocêntricas, para um individualismo, visão humana. Transição cultura, manifestação do Brasil colônia, império, para início da modernidade.
O realismo relaciona-se com urbano, transitando de Brasil rural, antigo, árcade, para o urbano, moderno, com traços típicos brasileiros distintos de europeus.
O texto trata também sobre aculturação, ou seja, adaptamos culturas vindas do externo.
Bosi cita em seu texto mais um exemplo de estudo de caso: “os profetas e o calundu”, que exemplifica a mistura da religião (africana e católica).
Calundu é uma gíria que se refere à religião afro descendente. Calundu é a interpretação católica (entre dois, ausência de Deus para católico, a morada do diabo), negação da religião afro. A disputa dos católicos para aceitarem as religiões afros.
Ao fim de seu texto, Bosi reforça a ausência de paciência no reconhecimento por parte da igreja católica, da cultura dominante em primeiro momento, e depois com a mudança de estado, transformações das artes na Europa, evolução cultural. A transição cultural entre a intolerância e o reconhecimento de cultura de outras religiões; A formação de nosso povo se relaciona ao tipo de colonização, influência religiosa e a transformação de cultura. Mais ou menos influência a partir de maiores ou menores condições de conquista, hegemonia do povo brasileiro. A mistura dialética é significado do povo miscigenado que somos. Somos um povo miscigenado, eclético, diferente, aberto, feliz, mesmo com as adversidades existentes, subestimações, preconceituosamente postos a margem, com dificuldades financeiras. Essa integração de personalidade é muito importante, única, exclusiva e necessária.
Bibliografia:
Bosi, Alfredo – “Colônia, culto e cultura”, in: Dialética da Colonização, 2ª edição, Companhia das Letras, São Paulo / SP.

0 comentários:

Postar um comentário